Supostas técnicas para o (me) adormecer
João Silva
Nota explicativa prévia: nos últimos anos, desenvolvi uma espécie de bebedeira de sono. Quando atinjo um determinado nível de cansaço, o corpo deixa de me obedecer e começo a adormecer, seja qual for a tarefa que tenho em mãos. Sim, há sinais, mas regra geral aterro num instante.
Ter um filho não é outra coisa que atingir um nível elevado de cansaço. Juntamos a tudo isso, o trabalho, a casa e os treinos. Nada de especial em relação às outras famílias, mas, tocando-nos a nós, têm sempre um sentido mais especial.
Portanto, terminada a nota prévia, o longo dos últimos quatro meses (feitos hoje), foi necessário virar técnico especializado em adormecimento... A ideia era que o fosse para o meu filho, mas a verdade é que muitas foram as vezes em que apliquei o manancial de estratégias e em que, ao fim de um belo bocado, fui eu quem começou a adormecer.
Ja aqui falei nos agachamentos e lunges como exercícios mais intensos para meter o Mateus a ver estrelinhas. A tudo isso, juntam-se as músicas inventadas à última hora, os embalos lentos acompanhados por palmadinhas suaves no rabito e, era aqui que queria chegar, as caminhadas intermináveis em marcha à frente e em marcha atrás pelo quarto, de preferência, a altas horas da noite.
Encosto-o ao meu peito, bem aninhado, e lá vou eu fazer quilómetros de embalo, aproveitando para lhe pedir (por vezes, encarecida e desesperadamente) que adormeça. Ele deve prestar tanta atenção a isso que muitas são as vezes em que acabo eu a adormecer com ele ao colo.
Sim, tem tanto de cómico quanto de assustador, porque desligo mesmo.
Aliás, recordo-me muitas vezes de um episódio em que adormeci a passar a ferro ou de outro em que o tinha nos braços, comecei a fazer da cintura um pêndulo, acabei por ter de o passar à mãe já que as portadas (=pestanas) já estavam a fechar.
No fim de contas, a cereja no topo do bolo veio em algumas noites em que a mãe lhe cantou belas cantigas para adormecer e fui eu quem acabou embalado com os olhos cerradinhos...
Passam hoje 4 meses desde que comecei a adormecer muito mais vezes e de forma inconsciente. Foram os 4 meses mais desafiantes da minha vida. Venham mais, muitos mais... Cá estarei, se não adormecer pelo caminho.
Se assim for, ele manda-me dois berros e mete-me em sentido.